INSTITUTO FUTURISTA

Iconarmadilhemos a verdade para que ninguém lhe toque.

e agora, José?

CALOR TROPICAL NA EUROPA - GLACIARES DERRETENDO - FLORESTAS EM BRASA - RIOS SECANDO - OCEANOS A SUBIR - ÁGUA DE BEBER EVAPORANDO

A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome, que zomba dos outros,
você que faz versos, que ama, protesta? e agora, José?
Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber,
já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio,
o bonde não veio, o riso não veio não veio, a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou,
e agora, José? E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre,
sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro,
sua incoerência, seu ódio - e agora? Com a chave na mão quer abrir a porta,
não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou;
quer ir para Minas, Minas não há mais.
José, e agora? Se você gritasse,
se você gemesse, se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia, sem
parede nua para
se encostar, sem
cavalo preto que
fuja a galope,
você marcha,
José! José,
para onde?

poema de Carlos Drummond de Andrade:

E agora José?

 
 
 
 

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